Atualmente, a rescisão unilateral dos contratos de saúde por parte das operadoras tem impactado na vida de diversos segurados/beneficiários, causando grande prejuízo, aflição e dor psicológica.
Porém aqueles beneficiários/segurados que estão em tratamento médico dependem de seus planos para continuidade e manutenção de sua saúde, nestes casos, tal rescisão é arbitrária e ilegal.
O contrato de plano de saúde é regulamentado pela Lei nº 9.656/98, Resolução nº 8 do Conselho de Saúde Suplementar (CONSU), Código de Defesa do Consumidor e outras normas complementares.
A operadora deve garantir o atendimento médico-hospitalar aos seus beneficiários, dentro dos limites contratuais e legais.
Desta forma, quando há a rescisão do contrato de plano de saúde por parte da operadora, daqueles que estão em tratamento médico, existe uma violação à Lei, uma prática ilegal, que tem vedação prevista no artigo 13, parágrafo único da Lei 9656/98:
Art. 13. Os contratos de produtos de que tratam o inciso I e o § 1o do art. 1o desta Lei têm renovação automática a partir do vencimento do prazo inicial de vigência, não cabendo a cobrança de taxas ou qualquer outro valor no ato da renovação.
Parágrafo único. Os produtos de que trata o caput, contratados individualmente, terão vigência mínima de um ano, sendo vedadas: II – a suspensão ou a rescisão unilateral do contrato, salvo por fraude ou não-pagamento da mensalidade por período superior a sessenta dias, consecutivos ou não, nos últimos doze meses de vigência do contrato, desde que o consumidor seja comprovadamente notificado até o quinquagésimo dia de inadimplência; e
III – a suspensão ou a rescisão unilateral do contrato, em qualquer hipótese, durante a ocorrência de internação do titular.
Neste mesmo sentido a Resolução nº 8 do CONSU: “a suspensão ou rescisão do contrato de plano ou seguro saúde, individual ou coletivo, firmado após 1º de janeiro de 1999, somente poderá ser efetivada após a admissão do beneficiário em novo plano ou seguro saúde ou após a sua vinculação a plano ou seguro-saúde de contratação coletiva”.
É nítida a preocupação do Legislador em criar uma “proteção” para aqueles beneficiários/segurados, quanto ao acesso contínuo a tratamento médico ou qualquer condição na qual impacte sua saúde e esteja vinculada diretamente ao contrato com o plano.
O Superior Tribunal de Justiça já se posicionou com relação ao tema admitindo a impossibilidade de rescisão unilateral de contrato de plano de saúde com beneficiários em tratamento, no Recurso Especial 1.995.100 – GO e entendeu que: “(…) a lei é clara no sentido de que o plano de saúde só pode rescindir o contrato em caso de fraude ou de não pagamento da mensalidade por período superior a sessenta dias, o que não se tratou no caso dos autos, em que a rescisão foi motivada pelo alegado alto custo do tratamento da paciente.(…)é vedada a rescisão unilateral do contrato de plano de saúde, por parte da operadora, mesmo que o seguro se encontre inadimplente ou em atraso há mais de 60 dias, quando o inadimplemento decorre do próprio tratamento médico”.
Ressaltando-se que a inadimplência referida deve ser em razão do próprio tratamento que está sendo realizado, e não somente por mera liberalidade.
Em recurso repetitivo foi firmada a tese no tema 1082: A operadora, mesmo após o exercício regular do direito à rescisão unilateral de plano coletivo, deverá assegurar a continuidade dos cuidados assistenciais prescritos a usuário internado ou em pleno tratamento médico garantidor de sua sobrevivência ou de sua incolumidade física, até a efetiva alta, desde que o titular arque integralmente com a contraprestação devida.” (REsp. 1842751/RS e REsp 1846123/SP).
Ainda, no que consiste a possibilidade de continuidade do tratamento iniciado antes da rescisão unilateral, tem o entendimento: “A imposição endereçada à parte requerida, referente à manutenção de custeio dos tratamentos continuados que já estavam em curso quando da prolação da sentença arrostada, mediante aplicação analógica do art. 8º, § 3º, da Lei nº 9.656/99, se mostra em consonância com o Direito à Vida e à Saúde, além de estar de acordo com Princípios da Razoabilidade e da Dignidade da Pessoa Humana.” (Acórdão 1241629, 07017145220188070001, Relatora: CARMELITA BRASIL, 2ª Turma Cível, data de julgamento: 1/4/2020, publicado no DJe: 4/5/2020).
Mesmo no caso de morte do titular do plano de saúde existe a possibilidade de manutenção do dependente por tempo determinado, decide o STJ no sentido de que mesmo em se tratando de plano coletivo, vem afirmando que a relação estabelecida entre os planos de saúde e o paciente é uma relação jurídica de consumo, a qual pode ser conceituada como uma relação existente entre fornecedor e consumidor que tem por objeto a aquisição de um produto ou a utilização de um serviço. 2 – A Lei dos Planos de Saúde 9.656/98, no seu art. 30, § 1º, prevê que o período de manutenção da condição de beneficiário a que se refere o caput será de um terço do tempo de permanência nos produtos de que tratam o inciso I e o § 1º do art. 1º, ou sucessores, com um mínimo assegurado de seis meses e um máximo de vinte e quatro meses. 3 – Havendo no contrato previsão de exclusão do dependente no caso de morte do titular, é de se admitir, por conseguinte, a manutenção do direito nos termos da Lei dos Planos de Saúde por período determinado conforme previsão normativa. 4 – No caso de falecimento do titular, não há que se falar em manter o plano e parcela, porquanto a operadora do plano detém outras categorias, com condições diferenciadas para o beneficiário se associar, se manifestar interesse. 5 – Recurso conhecido e parcialmente provido. Unânime Acórdão 1201677, 07022939220178070014, Relator: ROMEU GONZAGA NEIVA 7ª Turma Cível, data de julgamento: 18/9/2019, publicado no PJe: 20/9/2019.
Como podemos observar é unânime o entendimento de que o contrato de plano de saúde não comporta rescisão unilateral para os beneficiários que se encontram em tratamento médico, devendo esta prestação de serviço ser mantida até a conclusão do tratamento.
Como medida de proteção aos segurados para garantia ao acesso contínuo de seu tratamento médico, cabe a contestação da rescisão nos casos em que receber a notificação de rescisão, recorrer aos órgãos reguladores (ANS, PROCON…) e pleitear junto ao judiciário a manutenção de seu tratamento ou indenização pelos danos sofridos.
Autora: Renata Moreira – Advogada Especialista em Direito Médico e da Saúde