Apenas para situar o leitor, entre os dias 02 e 05 de novembro de 2023, ocorreram chuvas torrenciais acompanhadas de vendavais, atingindo até 100 km/h, causando danos significativos na região Sul do Estado de São Paulo, especialmente na Capital.
Inicialmente, é importante lembrar que o fornecimento de energia elétrica é um serviço de responsabilidade do Estado, delegado a empresas privadas por meio de concessões para a prestação desse serviço público. Em certos casos, há a responsabilidade objetiva da concessionária, conforme o artigo 37, §6º da Constituição Federal.
Cumpre esclarecer que, a princípio, a relação entre a concessionária e o usuário é de consumo, não podendo ser afastada a legislação do Direito do Consumidor. Diante disso, a vulnerabilidade do consumidor em relação à concessionária é evidente, considerando as diferenças econômicas, de riscos e de acesso ao judiciário.
Poderíamos considerar diversos aspectos protegidos pela legislação consumerista, destacando o artigo 14, que atribui responsabilidade ao fornecedor independentemente de culpa pela falha na prestação de serviços.
Ao correlacionar as chuvas e vendavais como causa para a interrupção no fornecimento de energia elétrica, surge a questão: a responsabilidade pelos danos aos usuários é exclusiva das concessionárias?
Diante de um evento isolado com duração limitada, como o ocorrido, a responsabilidade exclusiva da concessionária não pode ser imputada, pois esta não poderia agir durante a tormenta. No entanto, o que se observou não está diretamente relacionado à causa, mas ao restabelecimento do fornecimento de energia, revelando desorganização e má gestão da empresa diante da situação emergencial.
Na maior cidade financeira do Brasil, houve despreparo na contenção e falta de agentes treinados para restabelecer a energia, resultando em danos consideráveis à população, empresas e comércios. Algumas localidades ficaram sem energia por mais de uma semana, com períodos de reestabelecimento seguidos de novas interrupções, causando picos de energia e danos a aparelhos eletrodomésticos.
Diante desse cenário, os artigos 186 do Código Civil, combinados com os artigos 14 e 22 do Código de Defesa do Consumidor, respaldam o direito à indenização pelos prejuízos causados pela demora no restabelecimento de energia e pelos danos decorrentes de falhas no processo.
Portanto, frente ao longo período de falta de energia, é inquestionável o direito do consumidor ao ressarcimento por danos materiais causados pela falha da concessionária. Dependendo da situação, o consumidor pode buscar também indenização por danos morais, cuja quantificação será baseada no sofrimento demonstrado.
Cabe ao consumidor reunir as provas dos danos sofridos e ingressar com a devida ação cível de reparação de danos, eventualmente cumulada com pedido de indenização por danos morais. Condenações judiciais podem incentivar a revisão dos protocolos e operações da concessionária para uma resposta mais ágil em situações emergenciais, considerando que, para o corte de energia, a concessionária costuma ser eficiente.
Autor: Rafael Ribeiro – Sócio Advogado em Cardamone Ribeiro Advogados