Ante ao estupendo crescimento do mercado imobiliário, é altamente costumeiro que os agentes financiadores das obras, na grande maioria Bancos, como garantia de que a incorporadora/construtora pague o financiamento que é atrelado para a construção do empreendimento, registre na matrícula do imóvel a famosa HIPOTECA.
Em simples linguagem, HIPOTECA nada mais um direito real de garantia que recaí sobre um bem imóvel ou determinados bens móveis legalmente considerados imóveis, como navios e aviões, por exemplo, que assegura ao credor o pagamento de uma dívida. O princípio da garantia hipotecária consiste em o bem ser utilizado pelo devedor ao tempo, sem que precise entregá-lo ao credor, mas, caso não ocorra o pagamento do débito, haverá a conversão da posse do bem ao credor, ou seja, pela hipoteca o devedor ou terceiro garante uma dívida afetando um bem imóvel a seu pagamento. Caso a quantia avençada não seja paga, o credor poderá executar tal garantia para promover o recebimento de seu crédito.
Fator importante, é que a HIPOTECA possui como uma de suas características, um caráter acessório, logo o gravame utilizado como garantia, é acessório a uma dívida que se pretende liquidar, e por corolário, liquidada a dívida principal não subsiste o ônus real que visa garantir seu pagamento.
Todavia, nos casos dos imóveis que levam o gravame da garantia hipotecária, infelizmente existem casos de inadimplência pelas construtoras que deixam de quitar o financiamento contraído junto ao agente financeiro, este o credor hipotecário. E aí, se iniciam os problemas para os adquirentes do imóvel de boa-fé.
Embora os adquirentes tenham quitado a unidade imobiliária em sua íntegra, ao buscar registrar a escritura pública ou mesmo o termo de quitação da alienação fiduciária contraída para o pagamento do imóvel, se depara com uma devolutiva do Cartório de Registro de Imóveis, comumente assim redigida:
“Para que seja possível a venda de bens dados em garantia hipotecária, sob o âmbito do Sistema Financeiro de Habitação (SFH), necessário se faz a anuência expressa da instituição credora, conforme preceitua art. 1º, parágrafo único da Lei 8.004/90[1] e art. 292 da Lei de Registros Públicos (6.015/73).”[2]
ótica pontual legislativa os adquirentes se veem obrigados a se socorrerem dos meios jurídicos para reivindicar a baixa da garantia hipotecária.
São inúmeras as ações existentes em nossos tribunais, pois, o credor hipotecário deixa de solicitar a baixa do gravame junto ao cartório de registro de imóveis, em vista que o devedor (geralmente construtora) deixou de quitar o financiamento adquirido mesmo tendo outorgado a quitação do imóvel ao adquirente/credor fiduciário.
A Súmula de nº 308 do Superior Tribunal de Justiça é editada exatamente para apontar que a relação entre a construtora e o credor hipotecário não possui qualquer eficácia perante os adquirentes do imóvel, sendo incondicional a baixa do gravame hipotecário, como segue:
A hipoteca firmada entre a construtora e o agente financeiro, anterior ou posterior à celebração da promessa de compra e venda, não tem eficácia perante os adquirentes do imóvel. [3]
Para se editar a Súmula acima transcrita, evidente que a matéria já está absolutamente pacificada em nossos tribunais, veja abaixo algumas ementas extraídas dos respectivos julgados:
ADJUDICAÇÃO COMPULSÓRIA E DESONERAÇÃO DE HIPOTECA. Comprador que quitou suas obrigações tem o direito à escritura do imóvel. Hipoteca firmada entre a construtora e o agente financeiro é ineficaz perante o adquirente do imóvel. Súmula 308 do STJ. Acordo realizado entre o comprador e a construtora. Legitimidade passiva do Bancoque resistiu ao levantamento da hipoteca. Sucumbência dele. Aplicação de honorários recursais. Recurso desprovido.” (Apelação nº 0061163-18.2009.8.26.0114, Relator TEIXEIRA LEITE, J. 20.12.2016).
COMPRA E VENDA OBRIGAÇÃO DE FAZER C.C. INDENIZAÇÃO POR PERDAS E DANOS. Quitação do preço imóvel pelo comprador. Outorga de escritura definitiva livre de ônus hipotecário. Aplicação da súmula 308 do STJ. Ineficácia da garantia hipotecária em face do comprador da unidade imobiliária. Escritura que deve ser outorgada sem ônus hipotecário. Inversão do ônus de sucumbência – RECURSO DO RÉU BANCO DO BRASIL DESPROVIDO. RECURSO DOS AUTORES PROVIDO.” (Apelação nº 1087322-13.2015.8.26.0100. Relator: JOÃO FRANCISCO MOREIRA VIEGAS. 5ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de SP).
Portanto, quando o adquirente se deparar com eventual gravame de garantia hipotecária junto a matrícula do imóvel, o qual, não permite que o cartório de registro de imóveis efetue o registro da escritura pública, é necessário promover eventual Ação de Obrigação de Fazer com Pedido Liminar para a Baixa do Gravame de HIPOTECA, e nesta ação, evidentemente, cumular pedido de perdas e danos e astreintes.
Concluindo logicamente, uma vez que o imóvel objeto da garantia hipotecária é adquirido por terceiro, e ainda, com instrumento hábil para se comprovar a quitação frente ao vendedor, ora devedor da hipoteca, o credor hipotecário está obrigado a conceder a baixa do gravame da hipoteca junto ao registro imobiliário, independentemente da quitação da dívida, ou mesmo de sua relação contratual com o devedor originário.
Autor: Rafael Pimentel Ribeiro.
[1] http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8004.htm
[2] http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l6015compilada.htm
[3] https://www.stj.jus.br/docs_internet/revista/eletronica/stj-revista-sumulas-2011_24_capSumula308.pdf