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O CREDOR FIDUCIÁRIO RESPONDE (NA EXECUÇÃO JUDICIAL) PELAS DÍVIDAS CONDOMINIAIS INCIDENTES SOBRE O IMÓVEL OBJETO DA GARANTIA?

Inicialmente, podemos iniciar com uma pequena lembrança sobre posse e propriedade, e partindo da teoria de Ihering, que é a mais adotada na corrente do direito brasileiro, temos “que possuidor é aquele que detém pelo menos uma das faculdades da propriedade”, e assim, a posse pode se fragmentar em direta ou indireta, sendo certo que ambos os possuidores têm direito de exercer a proteção possessória, nos termos do artigo 1.210 do Código Civil.  

                Partindo sempre dessa premissa, insta apontar que o alienante (fiduciante ou credor fiduciário) fica investido num direito expectativo, que corresponde ao direito de recuperar automaticamente a propriedade plena, uma vez verificada a condição resolutiva, que, na relação fiduciária, constitui a própria causa da transmissão subordinada à condição: “o alienante, portanto, será um proprietário sob condição suspensiva, autorizado a praticar os atos conservatórios do seu direito eventual”[1].

                Nesses termos, pelo sistema da alienação fiduciária, o devedor fiduciante torna-se proprietário resolúvel da coisa e, enquanto adimplente em suas obrigações, torna-se legítimo possuidor da coisa (reservando, ao credor fiduciário, a posse indireta).

                Sucede que, as cotas condominiais constituem obrigação acessória ao contrato de alienação fiduciária, de forma que inadimplida as obrigações acessórias pelo devedor fiduciante, é dever da credora, ante ao ilícito contratual praticado, proceder com a “condição suspensiva”, tornando resoluto o malsinado contrato de alienação fiduciária, procedendo com a consolidação da propriedade.

                Contudo, inobstante a qualidade de obrigação acessória e condição resoluta ao contrato firmado entre a instituição financeira (credor fiduciário) e o devedor fiduciante, ora executado, a taxa condominial possui preferência em relação ao crédito fiduciário, em virtude da natureza coletiva e difusa, não podendo, o condomínio e condôminos serem lesados pelo inadimplemento da condição acessória.

                Nesse sentido, segundo o Superior Tribunal de Justiça, nos “contratos de alienação fiduciária em garantia de bem imóvel, a responsabilidade pelo pagamento das despesas condominiais recai sobre o devedor fiduciante enquanto estiver na posse direta do imóvel. O credor fiduciário somente responde pelas dívidas condominiais incidentes sobre o imóvel se consolidar a propriedade para si, tornando-se o possuidor direto do bem”[2]

                A escusa do credor fiduciário em consolidar a propriedade não pode causar danos à coletividade. A única hipótese em que o imóvel alienado fiduciariamente pode ser penhorado para satisfazer o débito oriundo de despesa condominial, é caso, existente a condição resoluta, advindo pela inércia e escusa do credor fiduciário, não ser promovida a consolidação da propriedade.

                Essa hipótese em que o credor fiduciário, não obstante a inadimplência do devedor fiduciante, alonga-se demasiadamente para executar a garantia fiduciária, além de agravar os prejuízos do próprio devedor fiduciante, também intensifica os danos ao Condomínio, sendo tal negligência um abuso de direitos.

                Entendemos configurado o abuso de direito por parte do credor fiduciário que se coloca numa posição confortável em executar a garantia no momento que melhor lhe aprouver.

Nesse sentido, há de se convir com Flávio Tartuce“que a demora em demasia pelo credor fiduciário para iniciar o procedimento extrajudicial da execução da alienação fiduciária poderia caracterizar situação abusiva, permitindo, portanto, que o Condomínio cobrasse a taxa condominial do credor fiduciário”[3].

Mas qual o prazo em que inércia do credor fiduciário poderia ser caracterizada como abusiva? Seguindo essa linha, a partir do 120º dia da inadimplência do devedor fiduciante, poderia ser caracterizado o abuso de direito caso a garantia não fosse executada pelo credor fiduciário.

                Portanto, o credor fiduciário pode sim responder pelas dívidas de condomínio existentes sobre a unidade em que está gravada o contrato de alienação fiduciária, esgotando os meios expropriantes do devedor fiduciante, se passa a penhora e excussão da propriedade plena, para então, o condomínio receba os valores pendentes da unidade ora inadimplente.

Autor: Rafael Pimentel Ribeiro


[1] HALHUB, Melhim Namem. Alienação fiduciária: negócio fiduciário. 6ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2019;

[2] REsp 1696038/SP, Rel. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, TERCEIRA TURMA, julgado em 28/8/2018, DJe 3/9/2018

[3] Flávio Tartuce faz analogia com o Provimento 11/2013 (it em 316.1) da qual afirma que, após a intimação do devedor, se o credor fiduciário não pagar o imposto de transmissão ‘inter vivos’ (ou laudêmio), em 120 dias os autos serão arquivados. TARTUCE, Flávio. Crédito condominial e a alienação fiduciária em garantia. Revista Bonijuris. Ano 31. Nº 659, Ago/Set 2019. p. 273 ;

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